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Esperamos com este Blog dividir um pouco das inúmeras histórias que acumulamos na nossa profissão. São relatos engraçados, tristes, surpreendentes...

domingo, 24 de janeiro de 2010

Inverno em Paris - Da guerra de neve em Versailles às Catacumbas

Por Michele Pacheco

Quando eu e o Robson decidimos dar um presente inesquecível de aniversário de 15 anos à filha dele, concordamos que era melhor fazer uma viagem curta, para ver se eles iriam curtir.
Ficamos uma semana em Paris e a vontade era de prolongar as férias indefinidamente.
A Cidade Luz é maravilhosa em todas as estações.
Mas, no inverno tem um charme especial.
Se um dia conseguirmos voltar lá, com certeza vamos dar preferência aos meses de frio.

Nos últimos dias de viagem, queríamos registrar na memória cada detalhe, para nunca esquecer.
Depois de passar a segunda-feira na Disneyland Parc, em Marne-La-Valée, fizemos outra viagem pelos arredores na terça.
O roteiro escolhido foi Versailles.
Mais uma vez, optamos pelo RER.

A viagem é barata, rápida e confortável.
É uma ótima idéia para escapar do trânsito complicado de Paris e das excursões, que são bem mais caras.
Os viajantes encontram inúmeras opções de agências de turismo e empresas que fazem esse tipo de trajeto.
Mas, não vale a pena.
O trem é muito bom e nos dá a oportunidade de admirar detalhes cotidianos dos moradores.
Como estávamos no Quartier Latin, pegamos o RER na estação Saint Michel-Notre Dame.

A viagem foi rápida. Cerca de 40 minutos.
O trem não estava cheio.
Descemos na estação em Versailles e caminhamos dois quarteirões até o palácio.
É fácil e não tem como errar.
As calçadas são largas e dá para caminhar sem problemas pela distância mínima e cheia de prédios históricos pelo caminho.
O palácio construído por Luis XIV é deslumbrante e serve como aula de história in loco.

Ao escolher o tipo de ingresso, optamos pelo mais simples, que dá acesso ao palácio, com direito ao guia eletrônico.
Há ainda ingressos que dão direito a exposições e a outros pontos do jardim.
O guia é como um walk-man que oferece explicações em várias línguas, inclusive o português.
Cada sala ou espaço visitado tem um número.
É só discar no aparelho e esperar as descrições das obras de arte e de tudo o que se passou em cada aposento.

Eu e o Robson nos distraimos várias vezes com os ambientes requintados e tínhamos que parar para esperar a Paula.
Ela estava em estado de graça.
Parecia perdida em outro mundo.
O duro era tirá-la do transe histórico para se posicionar para alguma foto, enquanto os demais turistas não apareciam.

O que chamou a atenção do Robson e da Paula foi o tamanho do trono e das camas dos Reis e das Rainhas.
Realmente é difícil imaginar como alguém conseguia se sentir confortável em móveis que mais parecem um sofazinho do que uma cama.
As curiosidades sobre os aposentos são muitas.
O narrador nos contava, com a cumplicidade de quem passa adiante uma fofoca, os detalhes que passavam despercebidos, como a porta por onde Maria Antonieta fugiu dos revoltosos.

Conhecemos também a galeria das guerras.
Ela foi elaborada depois da Revolução Francesa e da morte de Napoleão.
Nas paredes, quadros gigantescos reproduziam cenas das principais batalhas enfrentadas pela França na história do país.
O general que se considerava Deus e tentou conquistar o mundo ganha lugar de destaque.
Um dos lados do longo corredor é repleto das glórias e da derrota de Napoleão.

Do lado de fora do prédio, fomos surpreendidos por uma imensidão branca.
Confesso que achei os jardins mais bonitos no verão, com as fontes jorrando e inúmeras estátuas pelo caminho.
No frio, os lagos e fontes estavam congelados e as decorações cobertas para evitar estragos.
Mas, o inverno tem uma vantagem.
A neve!
E nós tivemos o privilégio de pegar o inverno mais rigoroso dos últimos 20 anos na França.

Nenhum turista resistiu à tentação de fazer uma guerra de bolas de neve.
A Paula não perdeu tempo e se sentiu o máximo achando que venceria o Robson.
Terrível engano!
Ele é maior e mais rápido.
Sem falar que as mãos maiores pegam mais neve.
Os dois se divertiram bastante.
A Paula corria atrás dele e só se dava mal.
Para cada bola lançada, ela era atingida por outras duas.
Sem falar nas bolas perdidas, vindas das batalhas em volta.
Pessoas de várias nacionalidades e línguas se misturavam na brincadeira, sem na verdade se unirem nela.

Depois de quase meia-hora de "guerra", a Paula estava toda branca e eu não conseguia deixar de rir.
Claro que me dei mal.
Os dois cansaram de trocar boladas e resolveram me incluir na batalha, mesmo a contragosto.
Meu sobretudo ficou coberto de neve e tratei de espaná-la rápido, antes que derretesse e eu ficasse molhada.

Passeamos bastante pelos jardins gelados.
Depois, almoçamos nos inúmeros restaurantes que existem nos quarteirões entre o palácio e a estação.
Voltamos a Paris e aproveitamos para olhar mais um pouco as vitrines.
Quando os franceses falam em "Liquidação de Inverno" acredite!
No Brasil, os preços são colocados e os comerciantes decoram as vitrines com letras graúdas anunciando as promoções.
No fundo, a gente fica com a sensação de que não teve quase nenhum desconto.
Mas, em Paris, é bem diferente.
Os preços na roupa indicam o valor antigo e o quanto custará com o desconto.
Algumas lojas chegavam a reduzir em 70% os valores dos produtos.
Dava vontade de comprar tudo.
Mas, não havia espaço suficiente nas bagagens.

Na quarta-feira, passeamos pela praça da Bastille, no Marais.
Lá ficava a famosa prisão, demolida durante a Revolução Francesa.
Nela, os maus-tratos representavam para o povo a tirania do Rei Luis XVI e da Rainha Maria Antonieta, que desperdiçavam dinheiro em festas grandiosas, enquanto o povo passava fome.
Foi uma caminhada agradável.
Tiramos foto na Colonne de Juillet, uma coluna oca de 51,5 metros de altura, no centro da praça, lembrando os mortos nos choques das ruas, em 1830.
Debaixo dela, estão restos mortais de 504 vítimas da batalha.

Fomos até a Place Des Vosges.
Construída há 400 anos, a antiga Place Royale mantém a mesma simetria de 36 casas ao redor, nove de cada lado.
Todas são feitas de tijolos e pedras, com telhado de ardósia e janelas estreitas e altas.
O local estava com bastante neve ainda e aproveitamos para sentar num dos inúmeros bancos e admirar a arquitetura.
Lá fica também a Maison Vitor Hugo, onde o escritor morou de 1832 a 1848.
Lá, escreveu a maior parte de Os Miseráveis. Hoje, é um museu.

Terminamos o dia passeando pelo Les Halles.
Além dos prédios diferentes e das estruturas modernas da praça, demos uma volta pelo shopping, que é um dos maiores da Europa.
O Robson parecia criança nas lojas de aparelhos eletrônicos.
A TV de LED, que é um sonho de consumo dele, estava três vezes mais barata do que no Brasil. Mas, ficamos com receio do imposto que teríamos que pagar na alfândega e desistimos.
Sei que o coração dele, pelo menos a parte consumista, ficou por lá!

No último dia em Paris, fomos conhecer as Catacombes.
O ponto turístico aparece em poucos guias e sites.
Encontramos por acaso numa revista só sobre Paris e decidimos ver de perto.
Como era próximo do Quartier Latin, fomos à pé.
Mas, quem preferir pode ir de metrô ou RER (Denfert-Rochereau).
A área das catacumbas tem 11 mil metros quadrados.

Caminhamos por dois quilômetros de labirintos, a mais de 11 metros de profundidade.
De início, você acha que a escada em caracol não vai acabar nunca e que o centro da terra está chegando.
A gente roda, roda, roda...
Até ter a noção de que está a muitos palmos de terra abaixo da superfície.
Claro que bate aquela falta de ar e a sensação de claustrofobia.
Mas, a ventilação é perfeita e logo a curiosidade ocupa todo o espaço do desconforto.

Com o crescimento de Paris, os antigos cemitérios foram desativados.
Onde abrigar todos os ossos era um desafio.
Ainda no século XVIII, foi construída a catacumba.
O labirinto de corredores revela um mundo debaixo da cidade.
Muitos trechos ficam fechados ao público.
O quartel general da resistência ficava ali, durante momentos conturbados da história francesa.
Dava para imaginar homens armados passando de um lado para o outro e saindo em pontos diferentes da cidade, surpreendendo o inimigo.
É surpreendente o que foi feito com os ossos.
Como a cidade na superfície respira arte, no subterrâneo não seria diferente.
Esculturas elaboradas foram feitas com as ossadas.
Crânios e outros ossos decoram as paredes.
Na entrada, uma mensagem esculpida em mármore alerta: você está entrando no reino dos Mortos.

Seria horripilante, se não fosse tão bonito e curioso.
Pelas paredes, entre as esculturas macabras, estão poemas de autores de diferentes séculos sobre a morte.
Algumas pessoas podem pensar que esse é um passeio muito estranho, mas vale a pena.
Em momento algum a gente fica deprimido, pensando em morte.
Pelo contrário, dá uma sensação boa de paz e de respeito com os mortos.
É Paris nos encantando de todas as formas possíveis.