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JUIZ DE FORA, MINAS GERAIS, Brazil
Esperamos com este Blog dividir um pouco das inúmeras histórias que acumulamos na nossa profissão. São relatos engraçados, tristes, surpreendentes...

sexta-feira, 30 de novembro de 2007

“Até que você é bonitinha...”

Por Robson Rocha

O momento em que o repórter aparece na matéria, é como se ele estivesse assinando seu material. É a hora em que o telespectador vê quem está lhe contando aquela história. O repórter pode aparecer no início da matéria, abertura. No meio da matéria, passagem. Ou no final da matéria, encerramento. Mas independentemente do momento, ele tem que estar bem no vídeo, o enquadramento tem que valorizar a imagem do repórter. Localizá-lo no ambiente, mas sem que o fundo tire a atenção do público no repórter.


Para melhorar a identificação do repórter pelo telespectador existem algumas regras, ângulos, luz e composição de imagem.
Algumas dessas regras foram herdadas da pintura da Grécia antiga, muitas da fotografia e também do cinema.
Mas voltando à passagem: Muitas vezes graças a isso, as pessoas vêem um repórter na rua e ficam na dúvida se realmente aquela pessoa seja quem eles acham que é.Isso acaba gerando, na rua, situações engraçadas.

Uma dessas situações aconteceu em Guarani, na Zona da Mata Mineira.

Uma senhora, já velhinha, parou do lado da Michele e perguntou:
– Você que é a Michele Pacheco, né?
A Michele mais que rápido respondeu:
– Sim, sou eu mesma.
A doninha afirmou:
– Gosto muito de você, te vejo todo dia. Seu trabalho é muito bom!
Michele:
– Que bom que a sra. gosta. Muito obrigada!
Antes de sair a velhinha fechou a conversa com chave de ouro, virou para a Michele e...
– Na televisão você parece tão grande. Mas, não liga não, você até que é bonitinha!

Do alto dos seus 1m e 67cm, o sorriso da Michele foi amarelando e fui obrigado a zoar dela o resto do dia. Convencido de estar fazendo bons enquadramentos nas passagens ou que pelo menos fiz minha repórter crescer.
Mas, realmente, bonititinha é f...

segunda-feira, 19 de novembro de 2007

Notícia porta de cadeia

Por Ricardo Bedendo - Jornalista

Caros amigos, é com grande satisfação que visitei e me tornei leitor deste espaço idealizado por dois profissionais da área "de primeira linha". Tive a oportunidade de encontrar e trocar muitas informações policiais nas coberturas jornalísticas com o Robson e com a Michele. Parabéns pela iniciativa, vocês são um exemplo de, acima de tudo, companheirismo. Pra ilustrar alguns destes momentos, encaminho uma história. Abraços...Bedendo


Notícia porta de cadeia

Superadas as carroças com os surrados pangarés puxando humildes trabalhadores calçando chinelos de dedo, sobre pilhas de entulhos, na tortuosa e íngreme avenida principal do Linhares, nos aproximamos do Ceresp. Esta passagem se constitui parte fundamental desta história, porque, por incrível que pareça, boa parte das vezes que seguíamos em direção à cadeia perdíamos alguns preciosos instantes na Diva Garcia, com poucos pontos de ultrapassagem. Para o fotógrafo, então, parecia a eternidade. Aqueles segundos ou minutos poderiam representar a perda da imagem principal da notícia na unidade prisional, ou a oportunidade única dada pela polícia de chegar um pouco mais perto, o que era raro, por justificadas questões de segurança.


Especialmente quando estávamos com um dos nossos motoristas mais antigos na "casa" o encontro com os cavalos e seus vagarosos passos parecia marcado. Ele reconhecia isto. Levantava as mãos pro céu, as batia no volante e suplicava:
- Será possível? O problema é comigo! Toda vez que passo aqui é a mesma coisa!
Ultrapassado o primeiro obstáculo entramos à esquerda e ganhamos a pequena reta, com fim no portãozinho de acesso a outro trecho curto, de subida e curvas ainda mais fechadas, até chegarmos ao prédio do cadeião, no pé da úmida montanha. Quando a informação era de que "a cadeia poderia virar" [1], em meio a mais um tumulto, o movimento intenso de viaturas policiais, em alta velocidade, naquele espaço apertado, aumentava nossa preocupação com um acidente. Felizmente, sempre passamos ilesos.

Na porta do Ceresp em dias de ocorrências, cada vez mais constantes, como brigas de presos, ameaças de rebelião, suspeitas de fuga, possibilidades de desabamento de muros e apreensão de armas e drogas e outros bagulhos mais, os cenários deixaram marcas. Em algumas semanas, a freqüência da ida da imprensa ao local era tão grande, que creio ter passado mais tempo na área da cadeia, do que em casa ou no jornal. Era preciso paciência e contato permanente com a equipe na redação, administrando o tempo de fechamento da reportagem e adiantando informações, para serem levadas à reunião na qual eram definidas as prioridades.
Era agonizante aguardar do lado de fora alguma novidade em meio ao entra e sai de carros da polícia e do Corpo de Bombeiros, com os motores acelerados e as sirenes ouvidas ao longe. Caso o policial na direção fosse conhecido, corria até o veículo e tentava arrancar algumas rápidas palavras. A atenção era redobrada, face ao clima tenso, responsável por transformar o ambiente em frações de segundos. Quando parecia calmo, começava o bochicho de novo.
Se o sol rachava sobre nossas cabeças, num calor de arrancar o couro, a encolhida sombra na barraquinha de lanche em frente ao prédio do Ceresp era disputadíssima. Às vezes, dava tempo de tomar um refrigerante, comer uma cocada, especialidade da casa, e colocar a conversa em dia com os colegas de imprensa. Mesmo assim, o sossego perdia para os mosquitos e seus companheiros insetos das mais variadas espécies, cachorros com os pêlos esgarçados, latidos desafinados e pulgas em festa, e cavalos, com as ferraduras desgastadas e o lombo castigado pelo sol e carrapatos, repetindo o estado precário daqueles das carroças, zanzando de um lado pro outro. Todos pareciam desnorteados, inclusive nós quando não tínhamos mais posição que aliviasse.

Quanto mais o sol dava as caras, mais fediam os latões de lixo perto da barraca, nos quais eram jogados, também, os dejetos da "panela de pressão" que se tornou o Ceresp. Na entrada do cadeião, íamos do deserto ao Pólo Norte. Quando chovia fino e fazia frio, o desafio era anotar alguma coisa no bloco respingado e ficar de cabeça em pé duelando com o vento, na tentativa frustrada de evitar que ele cortasse os lábios. Exigir do cara da barraquinha um caldinho quente, na linguagem popular o famoso "péla égua", aí já era demais.

Gostava de sentar no estreito banco de madeira próximo ao portão. Mas era por pouco tempo, já que as formigas e moscas administravam o pedaço. Quem também aparecia para algumas visitas indesejadas eram os marimbondos que, um pouco mais acima de nossas cabeças, construíam um belo condomínio, em um dos blocos do cadeião. Tanto lugar pro bicho resolver morar e foi escolher logo aquele! Aquela "casa" dos marimbondos inquietos sempre chamava a atenção. Imaginava se a trabalhosa obra fosse ao chão. O efeito da correria poderia ser maior do que em qualquer outro tipo de tumulto. Apesar dos "riscos" oferecidos pelos voadores ou terrestres e sorrateiros bichinhos, valia a pena ficar ali. Diria ser a posição estratégica. Sentado próximo ao portão principal, captava o bate papo de policiais, de familiares, observava de perto toda a movimentação. Precisava ter alguma informação para questionar a fonte oficial na entrevista concedida sempre no final da ocorrência. Repórter atônito e no ritmo dos pangarés come mosca, principalmente ali na porta do Ceresp, com aquele calor e o cheiro fétido dos latões.

Em meio às temperaturas, que mudavam repentinamente, e ao diversificado reino animal, parentes desesperados, com sacolas e alimentos nas mãos, na espera da notícia, sempre reservavam imagens e depoimentos reveladores da realidade de quem estava lá dentro das celas. Mulheres grávidas, algumas novinhas ou noivinhas apaixonadas, e idosos subiam o morro às pressas e tinham que ser acudidos. Faltava-lhes o fôlego e a pressão ameaçava o sofrido coração. Outros familiares chegavam no automóvel velho, caindo aos pedaços, mas tratado com carinho, com valor de carro de bacana. Na porta do Ceresp, víamos a dor em contraste com o alívio daqueles que cruzavam as grades, com destino à liberdade, pelo menos física. Esta talvez não fosse a "tão sonhada liberdade".

Na porta de uma unidade prisional, também aprendemos, visualizamos que o teor da notícia vai além do que acontece no interior do prédio. Nas imagens e nos depoimentos, podemos entender parte dos fatídicos caminhos percorridos por aquelas pessoas atrás das grades e como funciona o sistema que tenta administrar as conseqüências de realidades distintas, frutos da complexidade do sistema social. Compreender a essência não é fácil, ainda mais quando aquela realidade nos parece tão distante, às vezes inimaginável.


[1] Expressão usada pelos presos quando anunciam a possibilidade de um motim

domingo, 18 de novembro de 2007

Micos nossos de cada dia

Por Michele Pacheco

A maior preocupação de um repórter cinematográfico é com a imagem. Conseguir os melhores ângulos, a melhor luz... E o Robson leva isso a sério. Até demais! De olho na imagem, ele não pensa duas vezes em me colocar em situações, digamos, delicadas. Canteiro central de avenidas? Já conheço quase todos em Juiz de Fora. Bancos de praça? Posso descrever aqueles que estão em melhores condições em várias cidades da região.

Um dos meus primeiros micos profissionais foi numa reportagem sobre o Festival de Música Antiga em Juiz de Fora. Os organizadores estavam montando um tablado em frente ao Cine Teatro Central. Para a passagem, ele pediu que eu ficasse de costas para o teatro no meio do calçadão mais movimentado da cidade. O povo passando e meu querido colega gritando: mais para a direita...volta um pouquinho...para a direita de novo...assim não vai dar, vá para trás dois passos...um para frente... E eu lá, naquela dança maluca que só cinegrafista entende. As pessoas paravam para olhar, para rir... e eu naquele vai para lá e vem para cá. Por fim, ele chegou à conclusão de que o ângulo não estava legal.

Para completar o meu mico, o Robson saiu arrastando uma escadinha de madeira até o meio do calçadão. Pensei com meus botões que a criatura não seria capaz de chegar a tanto. Foi quando ouvi o grito todo animado: “suba aí que agora vai dar certo”. Para sorte dele, eu não xingo. Lá do alto, com vista privilegiada de todos que riam da minha cara, fiz a passagem e desci correndo, antes que ele tivesse mais alguma idéia brilhante.

Hoje, já nem perco tempo pensando no mico que vou pagar. Subo rápido onde ele manda e gravo. Ele já me colocou até no telhado da Basílica de Nossa Senhora do Pilar, em São João Del Rei. Fazíamos uma matéria sobre sinos e eu queria fazer a passagem num lugar alto que desse para ver os meninos tocando os sinos. Quando ele ficou todo animado com a idéia, eu já coloquei o pé atrás. Tanta animação não era um bom sinal.

Moral da história, depois de subir vários degraus de uma escada estreita até uma das torres, ele gentilmente sugeriu que eu fosse até a escadinha de metal entre uma torre e outra e ficasse em pé nela. Quem dá idéia atravessada, tem que ficar quieto. Quem mandou eu abrir a boca sobre a passagem?!

Pulei a janela da torre e fui subindo agachada pela
escada, que é estreita. No meio do telhado, tem uma placa de metal que é o único ponto menos inclinado. Eu estava pelejando para me equilibrar de salto, no alto do telhado, com um vento forte, sem olhar para baixo quando veio o conhecido grito de incentivo “anda, fica logo em pé que a minha imagem de fundo vai acabar”. Fiz a passagem, tentando não balançar muito com o vento, nem perder o equilíbrio. Confesso que ficou muito bom o resultado, mas, que eu tive vontade de torcer o pescoço dele, ah, isso eu tive!

Mas, vontade de esganá-lo não é novidade. Lembro de quando resolvemos fazer uma série de reportagens especiais para o aniversário de Juiz de Fora, em 2003. Produzimos, gravamos e editamos o material. Levamos três meses pesquisando e capturando as imagens do jeito que queríamos.
Numa das reportagens sobre o rio Paraibuna, vimos um banco de areia se formando no meio do rio e decidimos fazer uma passagem lá. Depois de três semanas vigiando o banco, fomos gravar. Tripé, bota de borracha e todos os cabos de microfone que o Robson achou na TV. Coloquei o blazer, passei a ponta do fio pelas costas, prendi na cintura, passei por dentro da calça e arrumei com cuidado para fora da galocha. Estava me sentindo um Indiana Jones de saia.

O Robson pegou o tripé e foi para um canto da margem. Eu, toda amarrada no cabo e com o microfone na mão fui para o rio. De longe parecia tão fácil! A distância entre a margem e o banco era maior do que eu pensava. Olhei em volta e o número de curiosos estava aumentando. Já tinha uns engraçadinhos gritando “pula, pula, pula”. Fazer o quê?! Estiquei a perna e... nada de alcançar o banco. Coloquei um pé na água para ver a profundidade e era fundo para ir andando. O jeito foi pular. Toda amarrada, com certeza a cena deve ter sido ridícula.
Enfim, lá estava eu no meio do banco que descobri não ser de areia e sim de lixo acumulado. E o troço mexia! Tinha bicho morto, copo de liquidificador e outras coisas que é melhor nem falar. E para melhorar a minha situação, o Robson berrou lá de longe: “faça a passagem andando”. Juro que tentei. A cada vez que eu andava, o “chão” mudava de lugar e desprendia um pedaço.

Nessa hora, já tinha um cordão de pessoas em volta do rio e gente perguntando se queria que chamassem o Corpo de Bombeiros! Quanto mais gente juntava, mais o lixo mexia, mais eu me estressava e mais o Robson pedia para repetir! Esganá-lo seria pouco, eu já imaginava todo tipo de tortura. Lá pelas tantas, ele se deu por satisfeito, falou que tinha valido e subiu o barranco com o tripé. E para sair do meio do rio? O banco tinha virado uma banqueta e ainda mais longe da margem. Parecia que ninguém tinha nada para fazer naquele dia, pois o povo não arredou o pé. Lá fui eu saltar para a margem. O fio atrapalhou e aterrissei de quatro na terra. Só não coloquei em prática meus planos de tortura, porque chegamos na TV e vimos que o sufoco rendeu um material lindo.

segunda-feira, 12 de novembro de 2007

Chuvas de verão? Sofrimento à vista!

Por Robson Rocha

Uma coisa que todo mundo que trabalha na externa do jornalismo aprende é a lidar com o humor de São Pedro. No período de outubro até março é difícil conseguir um dia em que você trabalhe com uma temperatura agradável e não transpire igual a uma tampa de chaleira.Geralmente quando você sai para uma reportagem o carro já está no sol, quando abre a porta do dito cujo, já vem um bafo quente. Entra e se sente em uma sauna seca. Só pelo calor já dá pra imaginar que o dia vai ser um... INFERNO. Aí você que está lendo diria: “é só ligar o ar condicionado!” – Brilhante! Mas isso prova que nunca entrou em um carro de reportagem.

Tudo bem. Vou seguir sua sugestão. Ligo o ar-condicionado. Surpresa! Ele não funciona. Aí é suar, literalmente, a camisa e torcer para o desodorante não vencer, digo, perder para o cecê.
Lá pelas 4 da tarde, São Pedro, gente boa, resolve dar um refresco. Baixar a temperatura? Não. Ele manda chuva.

Aí fu... Não posso escrever palavrão, senão a Michele vai reclamar. Mas voltando ao tempo, lembra que suei a tarde toda? Pois é, tenho que vestir a capa de chuva. Ela entra colando, puxando todos os pelinhos do braço.
Mas você vai lembrar da Michele e realmente... Ela tinha feito uma escovinha básica, rá, rá rá... Desculpe é que não resisti. O cabelo já era, o blaizer escondido pela capa... O modelito é lindo, isso sem esquecer a maquiagem e o detalhe do capuz.

Mas enquanto ela está na frente da câmera com a capa, eu desisti da capa. Eu suava tanto, que molhado por molhado, a chuva é fresca.

Na última enchente em Ewbanck da Câmara, cidade próxima à Juiz de Fora, fomos gravar. Enfiei minha maravilhosa 7 léguas; quando entrei na água, senti minha meia fria. Mas poderia ser o suor que foi resfriado junto com a bota, certo? Errado. A água encheu a bota, o solado dos dois pés rachou. E a molecada rolou de rir do mané arrastando os pés até poder passar a câmera pra Michele e tirar a bota.


Depois de comprar outro par de meias, calcei meu coturno e fui gravar. O Olavo Prazeres, da Tribuna de Minas, tirou a foto, logo depois. Dá para imaginar o meu humor, né?

E tem também a chuva de molhar bobo. É aquela que você não dá nada por ela e quando volta, uma hora depois, parece um pinto molhado. Dia de chuva fina é sinônimo de acidentes nas estradas e normalmente os veículos caem em ribanceiras, de pontes...
Em Ewbanck tem um viaduto de 30 metros de altura, onde sempre acontecem acidentes e os carros caem debaixo da estrutura e para fazer alguma imagem, tem que descer.
A descida tem muito mato, que você vai tombando com os pés, o mato se mistura com o mingau de água e terra e vira um escorregador. De cada 5 pessoas que descem, pelo menos três vão se encontrar com o chão. Na descida batem com a região glútea e na subida normalmente resvalam os lábios na relva. Posso dizer, por experiência própria, que a sensação não é muito boa. A relação de adjetivos que você quer dizer na hora é infinita.
E quando chega de volta à estrada molhado, sujo, com um vergão na testa (geralmente margem de estrada tem muito bambú e dá pra imaginar onde ele bate.) alguém te pergunta: “que cara feia é essa?” - Vou falar o quê?

sábado, 10 de novembro de 2007

"O Salvador da Pátria"

Por Marcelo Lima - Repórter da Rádio Solar

Olá amigos, Adorei o blog de vocês! Muito bem editado e com um layout leve e super agradável de ler (Nem parece que foi o Robson que fez..rs..rs).
Abaixo segue uma história fora do ar. Tenho a impressão que ficou longo, mas li e reli um milhão de vezes e não encontrei o que cortar.

Abraços Marcelo

"O Salvador da Pátria"


Mudanças bruscas na angulação de uma pauta sempre deixam o repórter meio perdido. Foi isso que aconteceu comigo em uma noite no final de 2006. Estava na redação finalizando a edição de retrospectiva do programa Ronda Policial, quando o porteiro da emissora me transferiuuma ligação. A voz apavorada do outro lado da linha avisava:
"Houve uma troca de tiros envolvendo policiais e assaltantes aqui! Duas pessoas estão mortas".

Sem que pudesse obter mais informações a ligação foi encerrada. Eram 23h30 de uma quinta-feira. Na emissora estavam apenas comunicadores e operadores de áudio. Pensei em acionar o motorista, mas não havia tempo suficiente para o deslocamento dele (ônibus), até a rádio onde pegaria o veículo da emissora. Eu só tinha o endereço e a possibilidade de uma boa reportagem para o Jornal da manhã.
Decidi equipar o meu próprio carro com "mantas magnéticas" com o logo da emissora e segui rumo a um bairro pobre da região sudeste de Juiz de Fora. O cenário era composto de ruas estreitas e vielas que lembram favelas cariocas. Sem o conhecimento de editor ou chefe de reportagem, assumi por conta própria os riscos que corria para obter a matéria. Tomei o primeiro susto no acesso à parte alta do bairro, uma rua escura e estreita. Acelerando o meu Fiesta 1.0 até o limite ouvi gritos para que eu parasse o carro.

Parei e fui interpelado por pessoas que eu não via o rosto. Uma delas perguntou:
- Vai aonde mermão?
Imediatamente respondi:
-Sou repórter da Rádio Solar, me ligaram daqui denunciando um crime.
Logo em seguida ouvi um grito com tom de autoridade:
- Deixa o cara subir! Foi a comunidade que chamô!!!

Tremendo dos pés a cabeça, engatei a primeira marcha e segui firme em direção à minha pauta. Confesso não ter visto nenhuma arma apontada na direção do meu carro, mas até hoje penso que ela existia. Não sabia quem eram as pessoas que me abordaram naquela espécie de “portaria”, mas tive a nítida sensação de que pensaram realmente em impedir minha entrada. Passado o susto inicial, logo acima encontro uma viatura daPM com dois policiais conversando do lado de fora. A dupla me olha com cara de espanto, enquanto eu os cumprimento e pergunto:

- Onde aconteceu a troca de tiros? Onde estão os corpos?
A resposta de um dos policiais é imediata e vem acompanhada de um conselho.
- É lá em cima no último escadão, mas se eu fosse você, não subiria lá não!!

Por alguns instantes pensei em desistir, afinal de contas, aquela reportagem já havia se tornado arriscada demais para o meu espírito de Tim Lopes. Por outro lado, pensava nos desconhecidos que me abordaram na parte baixa do bairro. Eles poderiam me hostilizar, já que a minha entrada foi condicionada ao fato de que a comunidade havia me convocado para uma matéria. Segui em frente. Fui orientado por um dos policiais a subir uma rua em contra-mão porque acima dela já me depararia com a cena do crime. No trajeto, olhos assustados me fitavam com surpresa pela minha presença naquele horário e diante daquela circunstância. Pensando que iria encontrar a dupla Robson e Michele (os repórteres mais bem informados de JF), subi o morro. Ledo engano. Eu era o único repórter na cena do crime.

Imediatamente meu carro pessoal foi cercado pelos moradores que gritavam revoltados:
- Assassinos! Mataram inocentes! Covardes!!!
Eu acabara de me tornar o Salvador da Pátria! Naquele momento me senti o Governador do Estado, o Secretário de Segurança Pública ou qualquer outra autoridade com poder para exonerar todos os policiais que estavam ali; uma espécie de Sassá Mutema, mas sem professorinha, porque eu estava totalmente sozinho com o meu ímpeto jornalístico.

Tive que pedir licença aos populares para abrir a porta do carro. Na minha frente havia um cordão de isolamento com cerca de 50 policiais militares, mas para chegar até lá, tinha que ouvir as informações que vinham de curiosos, moradores e alguns que se identificaram como sendo da família de uma das vítimas que eu ainda não sabia quem era. Me aproximei do cordão e foi recebido por um Major, já conhecido meu, que sentenciou:
-Você é louco!! O que você está fazendo aqui?
Respondi a ele:
- Me conta o que aconteceu. Vou ser direto, disse o policial: "Não posso dar grandes informações por que fui chamado para comandar essa operação de conter a população que está revoltada, mas posso te contar em Off. Policiais da viatura “tal” subiram aqui à procura de dois homens que assaltaram uma empresária no Bom Pastor (bairro de classe média alta na zona sul); e durante o cerco, um homem cruzou essa viela com uma arma na mão e um colega atirou nele. Ao se aproximar, o colega percebeu que a arma era de brinquedo, mas já não havia o que fazer. Trata-se de um jovem de 18 anos. O Corpo de Bombeiros teve dificuldade de acesso ao local para socorro à vítima e foi aí que me acionaram para cá, com a missão de conter a população que já começava a hostilizar a polícia. Não sei se houve troca de tiros. Não posso avaliar a atitude do meu colega, mas essa é a verdade".

Naquele momento, olhei em volta e percebi que eu seria o porta-voz do povo quando ultrapassasse o cordão de isolamento de volta. Isso porque os boatos já haviam tomado conta do bairro e davam conta de que dois jovens que eram irmãos tinham sido mortos, ou ainda, várias outras versões que não condiziam com os fatos. Caberia a mim dizer a verdade para a população, alguns sem saber o que acontecia de verdade e proibidos de chegarem até suas casas em razão do isolamento para garantir o trabalho da policia técnica.

Me deparei com uma questão. Como dar a informação sem provocar uma convulsão social e o violento confronto entre moradores e a polícia comigo na linha de tiro?
Respirei fundo e passei debaixo do cordão de isolamento voltando ao encontro dos moradores. Imediatamente fui cercado por eles. As perguntas eram tantas, e ao mesmo tempo, que deixei a condição de repórter e me tornei entrevistado. Os questionamentos se seguiram rapidamente aos gritos de alguns mais inflamados:
- Ta conivente com os pm´s assassinos!! Lincha!!! Lincha!!!

Meu carro se encontrava a uns 5 metros de distância e já sabia que teria dificuldades para deixar o bairro. Sentindo que a atribuição de controlar a população havia passado para mim desde a minha chegada ao local do crime, passei a conversar com todos, sem mesmo saber quem eram e que ligação tinham com o fato.
Liguei o gravador e coloquei na boca de todos que se aproximavam. Satisfeitos por terem recebido voz da imprensa, com o equipamento ligado fui gravando tudo e empurrando a massa na direção do meu carro. Ao chegar na porta, desliguei o gravador e disparei a seguinte frase:

Olha, o que aconteceu foi um absurdo!! Preciso acionar o Governador, o Secretário de Segurança, enfim, preciso obter um posicionamento deles, mas para fazer isso tenho que ir para a redação! Acompanhem a programação.

Com essas informações consegui entrar no carro, mas ainda temendo pela minha integridade física. Consegui ligar o carro, virá-lo na rua estreita e deixar o local sem maiores problemas. Entretanto, pelo caminho ainda ouvi alguns gritos de moradores que tinham visto o meu carro subir com identificação da emissora, ligaram o rádio, e claro, não ouviram nada, pois diante da minha situação não havia condição de transmitir um flash sequer. Isso fez com que a teoria de alguns inflamados, aparentemente se confirmasse. Eu estaria realmente do lado dos policiais. Deixei o bairro tremendo com medo de pedradas e sob os gritos de Vendido!! Covarde!! Conivente!!

Essa foi, sem dúvida, uma experiência que me ensinou muito e me fez crescer profissionalmente.

segunda-feira, 5 de novembro de 2007

Cobertura inesquecível 2

Por Michele Pacheco

Já contei parte das nossas aventuras na enchente de 2000 no Sul de Minas. No primeiro texto, terminei falando que geramos uma matéria com imagens exclusivas de Aiuruoca e São Lourenço. Achamos que enfim viria o descanso merecido. Mas, o recado foi outro.

Tivemos a tarde para nos organizar e partir na madrugada seguinte rumo ao Sul, sem previsão de destino nem de retorno. No caminho, combinamos nossa estratégia de ação. Pouco tempo em cada cidade: numas faríamos imagens e entrevistas, em outras, faríamos imagens e passagem.
Em São Lourenço, a água tinha baixado um pouco e conseguimos acesso de carro a uma parte do centro. Entramos num barco e fizemos imagens das áreas alagadas. Uma cena que não esqueço, foi passar pelo Parque e ver inúmeros galões de água mineral flutuando. Com medo do que iria acontecer nos dias seguintes, moradores se arriscavam na enchente para recolher as garrafas e os galões. Achei o fato importante e usei como passagem, dentro do barco.

Em Três Corações, nos arriscamos por uma ponte interditada para evitar um desvio demorado. As imagens nos assustaram. Em alguns bairros, só dava para ver as antenas parabólicas acima do nível da água.

Fomos cobrindo todas as cidades atingidas até a divisa com São Paulo, origem das primeiras trombas d'água. Missão cumprida, seguimos para Varginha com o que tínhamos conseguido.
Ficamos à disposição do Péricles de Souza, que era o editor responsável da TV Alterosa no Sul de Minas, para dar suporte pelo tempo que fosse necessário, já que todas as equipes estavam sobrecarregadas.

No dia seguinte, fomos enviados às cinco da manhã para Pouso Alegre. No caminho, as cenas eram de devastação e água por toda parte. Ao mesmo tempo, era deslocada de BH a equipe técnica com os equipamentos de Up-link para garantir a transmissão ao vivo. O governador Itamar Franco tinha transferido a sede do governo para lá, em função das tragédias da chuva. Fomos recebidos na entrada de Pouso Alegre e cruzamos as avenidas alagadas. Passamos no sufoco e vimos um carro de Varginha ficar preso na enchente. Enfim, equipe reunida, começou a maior aventura da minha vida.


Uma turma ficou no local onde estava montada a sede do governo de Minas, acompanhando os passos do governador e entrando ao vivo de lá. Nós, fomos para a enchente. Só tivemos tempo de dar alô ao pessoal e correr para o local da nossa entrada. Era na mesma avenida onde tínhamos passado com dificuldade. Os técnicos de Varginha acertaram o sinal. Eu e o Robson acertamos a ação. Fomos com cabos e tudo para dentro d'água, para desespero da equipe técnica. Eu ia andando até perto das casas alagadas. A idéia dele era entrar na casa e mostrar os estragos e objetos abandonados. Mas, já no primeiro degrau entre a rua e a casa, a água chegou no meu joelho. Antes que eu tivesse que entrar nadando, preferi mostrar as casas e a avenida, que é o principal acesso à cidade. Tudo pronto, Benny Cohen e Laura Lima deram a deixa e mandei ver no texto combinado. No fim do vivo, eu passava alerta da polícia de que a avenida estava inundada e que os carros pequenos não estavam mais conseguindo passar. Quem aparece na imagem? Um Fiat Uno a toda, embalado para passar e desmentindo ao vivo a informação. Mas, a ajuda divina funcionou e o desmancha-prazer começou a ratear e parou no meio da enchente. Isso tudo aconteceu em segundos, no ar. Pelo retorno, eu ouvia o pessoal falando do carro e rindo. O jeito foi improvisar: "E quem se arrisca, acaba como aquele motorista, preso na enchente". O pior foi ouvir a gozação depois, do pessoal da técnica dizendo que eu tinha azarado o coitado do motorista.
As transmissões ao vivo são sempre imprevisíveis. Mas, essa é uma outra história!

sexta-feira, 2 de novembro de 2007

Cobertura inesquecível

Por Michele Pacheco

Todo jornalista tem lembranças do trabalho mais marcante que já fez. Um dos meus preferidos foi a cobertura das trombas d´água no Sul de Minas no início de 2000. Uma seqüência de tempestades violentas deixou inúmeras cidades inundadas.


Na época, eu e o Robson trabalhávamos na sucursal da TV Alterosa em Juiz de Fora (a sucursal virou emissora dois meses depois). Lembro que passamos o dia em São Brás do Suaçuí, perto de Congonhas, fazendo uma reportagem produzida para o Alterosa Esporte com o Lincoln, que jogava no Atlético Mineiro. Depois de um dia numa fazenda, sob um sol de rachar, chegamos em Juiz de Fora no fim da tarde, doidos por um banho e descanso. No meio do caminho, veio a ligação de Belo Horizonte. Era a Cristine Cruz, produtora do interior (hoje na Record Minas), avisando que uma tempestade tinha inundado Aiuruoca e que a equipe tinha que seguir para lá o mais rápido possível. Fomos direto.
Chegamos na cidade por volta de sete da noite. O carro teve que ser abandonado na entrada da cidade, pois as ruas estavam alagadas. O centro fica no alto e o córrego passa por várias ruas mais baixas. Resultado, atravessamos a inundação, rodamos todo o centro à pé, fomos às casas e empresas alagadas, ouvimos moradores. Fomos para o hotel por volta de meia-noite.
Às cinco da manhã, estávamos partindo para Caxambu. Aproveitamos que a cidade é colada em Aiuruoca para pegar o rescaldo dos estragos, aliviando o serviço da equipe de Varginha. Ficamos sabendo que São Lourenço estava isolada e que a equipe do Sul não tinha conseguido entrar. Já que estávamos perto, resolvemos tentar.

Na entrada de São Lourenço, a ponte estava interditada, com risco de desabamento. Achamos que nosso esforço tinha ido por água abaixo, mas vimos um barco e pedimos carona. Em dez minutos, gravamos a parte alagada mais próxima e os moradores nos telhados das casas. O único susto foi quando um monte de galhos agarrou na hélice do barco e nós ficamos à deriva na correnteza forte, correndo o risco de bater numa casa no meio do caminho ou na rede de alta tensão que ficou próxima da água. Imaginem o desespero do Robson, que não sabe nadar e tem 1,90m, espremido no fundo do barco pequeno para não esbarrar nos fios. Tudo deu certo e voltamos para a estrada.
Tínhamos que estar em Juiz de Fora até as dez da manhã para gerar o material para Belo Horizonte pela Embratel. Foi um sufoco só, mas valeu a pena. Furamos todas as outras emissoras com as imagens inéditas. Naquele dia, fomos a única equipe de jornalismo a conseguir imagens de dentro de São Lourenço. Missão cumprida, só queríamos descansar. Mas, São Pedro tinha outros planos e mandou mais trombas d'água para o Sul. Resultado, fomos deslocados sem previsão para voltar para casa. Mas, isso é outra história...