Por Michele Pacheco
A maior preocupação de um repórter cinematográfico é com a imagem. Conseguir os melhores ângulos, a melhor luz... E o Robson leva isso a sério. Até demais! De olho na imagem, ele não pensa duas vezes em me colocar em situações, digamos, delicadas. Canteiro central de avenidas? Já conheço quase todos em Juiz de Fora. Bancos de praça? Posso descrever aqueles que estão em melhores condições em várias cidades da região.
Um dos meus primeiros micos profissionais foi numa reportagem sobre o Festival de Música Antiga em Juiz de Fora. Os organizadores estavam montando um tablado em frente ao Cine Teatro Central. Para a passagem, ele pediu que eu ficasse de costas para o teatro no meio do calçadão mais movimentado da cidade. O povo passando e meu querido colega gritando: mais para a direita...volta um pouquinho...para a direita de novo...assim não vai dar, vá para trás dois passos...um para frente... E eu lá, naquela dança maluca que só cinegrafista entende. As pessoas paravam para olhar, para rir... e eu naquele vai para lá e vem para cá. Por fim, ele chegou à conclusão de que o ângulo não estava legal.
Para completar o meu mico, o Robson saiu arrastando uma escadinha de madeira até o meio do calçadão. Pensei com meus botões que a criatura não seria capaz de chegar a tanto. Foi quando ouvi o grito todo animado: “suba aí que agora vai dar certo”. Para sorte dele, eu não xingo. Lá do alto, com vista privilegiada de todos que riam da minha cara, fiz a passagem e desci correndo, antes que ele tivesse mais alguma idéia brilhante.
Hoje, já nem perco tempo pensando no mico que vou pagar. Subo rápido onde ele manda e gravo. Ele já me colocou até no telhado da Basílica de Nossa Senhora do Pilar, em São João Del Rei. Fazíamos uma matéria sobre sinos e eu queria fazer a passagem num lugar alto que desse para ver os meninos tocando os sinos. Quando ele ficou todo animado com a idéia, eu já coloquei o pé atrás. Tanta animação não era um bom sinal.
Moral da história, depois de subir vários degraus de uma escada estreita até uma das torres, ele gentilmente sugeriu que eu fosse até a escadinha de metal entre uma torre e outra e ficasse em pé nela. Quem dá idéia atravessada, tem que ficar quieto. Quem mandou eu abrir a boca sobre a passagem?!
Pulei a janela da torre e fui subindo agachada pela
escada, que é estreita. No meio do telhado, tem uma placa de metal que é o único ponto menos inclinado. Eu estava pelejando para me equilibrar de salto, no alto do telhado, com um vento forte, sem olhar para baixo quando veio o conhecido grito de incentivo “anda, fica logo em pé que a minha imagem de fundo vai acabar”. Fiz a passagem, tentando não balançar muito com o vento, nem perder o equilíbrio. Confesso que ficou muito bom o resultado, mas, que eu tive vontade de torcer o pescoço dele, ah, isso eu tive!
Mas, vontade de esganá-lo não é novidade. Lembro de quando resolvemos fazer uma série de reportagens especiais para o aniversário de Juiz de Fora, em 2003. Produzimos, gravamos e editamos o material. Levamos três meses pesquisando e capturando as imagens do jeito que queríamos.
Numa das reportagens sobre o rio Paraibuna, vimos um banco de areia se formando no meio do rio e decidimos fazer uma passagem lá. Depois de três semanas vigiando o banco, fomos gravar. Tripé, bota de borracha e todos os cabos de microfone que o Robson achou na TV. Coloquei o blazer, passei a ponta do fio pelas costas, prendi na cintura, passei por dentro da calça e arrumei com cuidado para fora da galocha. Estava me sentindo um Indiana Jones de saia.
O Robson pegou o tripé e foi para um canto da margem. Eu, toda amarrada no cabo e com o microfone na mão fui para o rio. De longe parecia tão fácil! A distância entre a margem e o banco era maior do que eu pensava. Olhei em volta e o número de curiosos estava aumentando. Já tinha uns engraçadinhos gritando “pula, pula, pula”. Fazer o quê?! Estiquei a perna e... nada de alcançar o banco. Coloquei um pé na água para ver a profundidade e era fundo para ir andando. O jeito foi pular. Toda amarrada, com certeza a cena deve ter sido ridícula.
Enfim, lá estava eu no meio do banco que descobri não ser de areia e sim de lixo acumulado. E o troço mexia! Tinha bicho morto, copo de liquidificador e outras coisas que é melhor nem falar. E para melhorar a minha situação, o Robson berrou lá de longe: “faça a passagem andando”. Juro que tentei. A cada vez que eu andava, o “chão” mudava de lugar e desprendia um pedaço.
Nessa hora, já tinha um cordão de pessoas em volta do rio e gente perguntando se queria que chamassem o Corpo de Bombeiros! Quanto mais gente juntava, mais o lixo mexia, mais eu me estressava e mais o Robson pedia para repetir! Esganá-lo seria pouco, eu já imaginava todo tipo de tortura. Lá pelas tantas, ele se deu por satisfeito, falou que tinha valido e subiu o barranco com o tripé. E para sair do meio do rio? O banco tinha virado uma banqueta e ainda mais longe da margem. Parecia que ninguém tinha nada para fazer naquele dia, pois o povo não arredou o pé. Lá fui eu saltar para a margem. O fio atrapalhou e aterrissei de quatro na terra. Só não coloquei em prática meus planos de tortura, porque chegamos na TV e vimos que o sufoco rendeu um material lindo.
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